segunda-feira, 17 de novembro de 2008

O Direito à vida e as obrigações do Estado em matéria de Saúde.

Celso Spitzcovsky

A preocupação do homem com a sua saúde sempre foi uma constante como maneira de preservar a própria sobrevivência, sendo inúmeros os progressos realizados à medida que a ciência avança e faz novas descobertas, diversificando as possibilidades de tratamento.

Essa evolução cristalina das formas de tratamento de doenças, de preservação da saúde, enfim, veio, no entanto, acompanhada da multiplicação dos seus custos, o que tornou impossível, em muitos países, o acesso da população em geral a essas evoluções tecnológicas. O próprio Estado, que surge como o responsável pela preservação desse acesso ao serviço de saúde, com o passar do tempo, revelou-se incompetente ou impotente para fazer frente aos seus elevados custos.

Deve-se registrar que a questão relacionada à saúde reflete serviço público com características específicas, pois surge como uma das formas de garantia do direito à vida localizado no caput do art. 5.º da CF, caracterizando-se como cláusula pétrea.

Essa previsão, expressa pela primeira vez dentro de uma Constituição em nosso País, representa um avanço significativo nas relações sociais, na medida em que impede a possibilidade de o legislador e o administrador criarem alguma situação que implique esvaziamento do conteúdo desse dispositivo constitucional.

Importante consignar, também, que a previsão do direito à vida possui uma íntima relação com um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, vale dizer, o da Dignidade da Pessoa Humana, relacionado no art. 1.º, III, da CF, cujo conteúdo demanda investigações para que não se torne letra morta. Em outras palavras, qualquer previsão legal, qualquer atitude tomada pelo Poder Público que provoque como conseqüência o esvaziamento do direito à vida trará, como corolário, o desrespeito à dignidade da pessoa humana, pois são dois vetores considerados igualmente fundamentais pela Constituição.

Estabelecida, portanto, a relação entre o serviço de saúde e os conceitos de direito à vida e dignidade da pessoa humana, cumpre observar que a execução daquele, desconsiderando ou mesmo enfraquecendo esses valores básicos fixados pela Constituição, torna-se, além de inadmissível, inconstitucional.

Nesse contexto, não se pode descurar da necessidade de se estabelecerem os parâmetros da atuação do Poder Público em relação ao serviço de saúde e a possibilidade de sua responsabilização pelo descumprimento dos seus deveres constitucionais. Nesse sentido, cumpre não perder de vista que a análise dessa questão deve partir da interpretação dos dispositivos constitucionais pertinentes.

Esse aspecto assume relevo na medida em que, sendo a Constituição um documento de natureza política, fruto de um pacto social, a interpretação de suas normas assume um caráter particular, com regras próprias, totalmente diferentes daquelas vislumbradas para a legislação infraconstitucional. Em outras palavras, as características peculiares de um Texto Constitucional impõem a utilização de princípios específicos para a interpretação de suas normas, entre os quais destacamos, pela importância de que se revestem: a) Princípio da Unidade da Constituição; b) Princípio da Efetividade.

O Princípio da Unidade da Constituição impõe ao intérprete a obrigação de analisar as normas constitucionais não de forma isolada, mas, no contexto em que se inserem, de maneira a evitar a existência de contradições, como bem captado pela melhor doutrina:

"O princípio da unidade da Constituição ganha relevo autônomo como princípio interpretativo quando com ele se quer significar que o Direito Constitucional deve ser interpretado de forma a evitar contradições (antinomias, antagonismos) entre as suas normas e, sobretudo, entre os princípios jurídicos-políticos constitucionalmente estruturantes. Como 'ponto de orientação', 'guia de discussão' e 'factor hermenêutico de decisão' o princípio da unidade obriga o intérprete a considerar a Constituição na sua globalidade e procurar harmonizar os espaços de tensão [...] existentes entre as normas constitucionais a concretizar (ex.: princípio do Estado de Direito e princípio democrático, princípio democrático e princípio socialista, princípio unitário e princípio da autonomia regional e local etc.). Daí que o intérprete deva sempre considerar as normas constitucionais, não como normas isoladas e dispersas, mas sim como preceitos integrados num sistema interno unitário de normas e princípios" [1].

"O papel do princípio da unidade é o de reconhecer as contradições e tensões reais ou imaginárias que existam entre normas constitucionais e delimitar a força vinculante e o alcance de cada uma delas. Cabe-lhe, portanto, o papel de harmonização ou 'otimização' das normas, na medida em que se tem de produzir um equilíbrio, sem jamais negar por completo a eficácia de qualquer delas. Também aqui, a simplicidade da teoria não reduz as dificuldades práticas surgidas na busca do equilíbrio desejado e na eleição de critérios que possam promovê-lo" [2].

Anote-se que acerca dessa matéria não tem sido outro o entendimento consolidado tanto nos Tribunais quanto na melhor doutrina, conforme se verifica nos seguintes excertos:

"Uma disposição constitucional não pode ser considerada de forma isolada nem pode ser interpretada exclusivamente a partir de si mesma. Ela está em uma conexão de sentido com os demais preceitos da Constituição, a qual representa uma unidade interna" [3].

"Todas as normas constitucionais devem ser interpretadas de tal maneira que se evitem contradições com outras normas constitucionais. A única solução do problema, coerente com este princípio, é a que [se] encontre em consonância com as decisões básicas da Constituição e evite sua limitação unilateral e aspectos parciais" [4].

Assim, torna-se claro que a necessidade de levar-se em consideração esse princípio está na obrigação do intérprete de procurar harmonia entre os dispositivos constitucionais de modo a fortalecer o todo em que se inserem. O princípio da efetividade atribui a uma norma constitucional, em razão da posição por ela ocupada no ordenamento jurídico, o significado que maior eficácia lhe ofereça. Nesse sentido, encontramos as considerações de J. J. GOMES CANOTILHO:

"Este princípio, também designado por princípio da eficiência ou princípio da interpretação efetiva, pode ser formulado da seguinte maneira: a uma norma constitucional deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe dê. É um princípio operativo em relação a todas e quaisquer normas constitucionais, e embora a sua origem esteja ligada à tese da atualidade das normas programáticas (Thoma) é hoje sobretudo invocado no âmbito dos direitos fundamentais (no caso de dúvidas deve preferir-se a interpretação que reconheça maior eficácia aos direitos fundamentais)" [5].

Das lições do reconhecido jurista português, cumpre destacar o trecho em que ele aponta para o campo de maior repercussão desse princípio dentro das Constituições, vale dizer, o dos direitos fundamentais. Assim, toda vez que se apresentar qualquer sorte de dúvida quanto à interpretação de norma constitucional relacionada à prestação do serviço de saúde, deverá conferir-se a ela o sentido que maior eficácia lhe ofereça, ou seja, o sentido que lhe atribua maior densidade de modo a preservar a vida e a dignidade da pessoa humana.

Na mesma direção, encontramos as lições de JORGE MIRANDA, outro notável jurista português, que assim se pronunciou:

"Deve assentar-se no postulado de que todas as normas constitucionais são verdadeiras normas jurídicas e desempenham uma função útil no ordenamento. A nenhuma pode dar-se uma interpretação que lhe retire ou diminua a razão de ser. Mais: a uma norma fundamental tem de ser atribuído o sentido que mais eficácia lhe dê; a cada norma constitucional é preciso conferir, ligada a todas as outras normas, o máximo de capacidade de regulamentação" [6].

Qualquer interpretação que se pretenda oferecer a um dispositivo constitucional, portanto, mormente para aqueles inseridos entre os direitos fundamentais, que importe em retirar ou mesmo diminuir a sua eficácia, deverá ser considerada inconstitucional. De outra parte, sobreleva notar que, embora tenham todas as normas constitucionais o mesmo patamar hierárquico, algumas delas apresentam um campo de irradiação maior, razão pela qual surgem como parâmetros de interpretação das demais.

São os princípios constitucionais que, por sua importância, merecem uma análise especial na medida em que surgem como paradigma para que se possa alcançar a correta interpretação das demais normas constitucionais.

De acordo com essas regras de interpretação das normas constitucionais é que deverá se desenvolver a análise dos conceitos de "vida", "dignidade da pessoa humana" e "saúde", fundamentais para que se possam apurar os limites da atuação e da responsabilização do Poder Público.

Sobreleva notar que a presença da dignidade da pessoa humana entre os fundamentos de nosso Estado Democrático de Direito surge como corolário de previsões semelhantes encontradas em todas as Constituições pós-Segunda Guerra Mundial como forma de reação às incontáveis atrocidades praticadas por inúmeros governantes contra minorias para a preservação de objetivos questionáveis. Nesse particular, oportuna a transcrição dos ensinamentos do jurista alemão KONRAD HESSE, que, em comentários à Constituição alemã, assim se manifestou:

"O artigo de entrada da Lei Fundamental normaliza o princípio superior, incondicional e, na maneira da sua realização, indisponível, da ordem constitucional: a inviolabilidade da dignidade do homem e a obrigação de todo o poder estatal, de respeitá-la e protegê-la. Muito distante de uma fórmula abstrata ou mera declamação à qual falta significado jurídico, cabe a este princípio o peso completo de uma fundação normativa dessa coletividade histórico-concreta, cuja legitimidade, após um período de inumanidade e sob o signo da ameaça atual e latente à 'dignidade do homem', está no respeito e na proteção da humanidade" [7].

No mesmo sentido, oportuna a transcrição dos ensinamentos do eminente constitucionalista português JORGE MIRANDA, para quem todo o sistema dos direitos fundamentais repousa no princípio da dignidade da pessoa humana:

"Quanto fica dito demonstra que a Constituição, a despeito de seu carácter compromissório, confere uma unidade de sentido, de valor e de concordância prática ao sistema dos direitos fundamentais. E ela repousa na dignidade da pessoa humana, proclamada no art. 1.º, ou seja, na concepção que faz da pessoa fundamento e fim da sociedade e do Estado" [8].

Ainda sob esse aspecto, oportuna a reprodução do pensamento do ilustre constitucionalista PAULO BONAVIDES, para quem "nenhum princípio é mais valioso para compendiar a unidade material da Constituição que o princípio da dignidade da pessoa humana" [9].

Os excertos colacionados autorizam a conclusão segundo a qual a dignidade da pessoa humana surge, por conseguinte, como núcleo essencial dos direitos fundamentais, fonte ética que confere unidade de sentido, de valor e de concordância prática a todo o sistema. Dessa forma, ao prescrever o direito à vida como direito fundamental, quis nossa Constituição garantir, na verdade, muito mais, pois pouca importância terá ela se não vier preservada de maneira digna.

Em nosso País, o direito à existência digna é refletido, entre outros aspectos, pela obrigação atribuída ao Estado e à sociedade de realização de ações integradas para a implementação da seguridade social (art. 194), destinada a assegurar a prestação dos direitos inerentes à saúde, à previdência e à assistência social. Nesse contexto, estão incluídas as ações no campo da saúde, realizadas mediante políticas sociais e econômicas que objetivem a redução dos riscos de doença e de outros agravos, garantindo-se o acesso universal igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (art. 196).

Assim, por força dos elementos até este passo desenvolvidos, outra não poderia ser a conclusão quanto à impossibilidade de se dissociarem os vetores da dignidade da pessoa humana do direito à vida e à saúde. Oportuna a averiguação da posição adotada por nossa Suprema Corte ao reconhecer que "o direito a saúde [...] representa conseqüência constitucional indissociável do direito a vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional" [10].

Pode-se dizer, pois, que a previsão do direito à vida como cláusula pétrea e sua íntima relação com o fundamento constitucional da dignidade da pessoa humana trazem, como conseqüência, a necessidade de o Poder Público assegurar a eficiente prestação dos serviços públicos necessários à garantia de uma condição de vida digna, sob pena de responsabilidade.

Cumpre registrar que a questão relativa à saúde consta no Título VII, Capítulo II, relativo à Seguridade Social, como se observa da redação apresentada pelo art. 194 da CF, que a seguir se reproduz:

"Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.
Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes objetivos:
I - universalidade da cobertura e do atendimento;" .

Esse aspecto assume extrema importância na medida em que a diretriz estabelecida pela Constituição aponta para a necessidade de o Poder Público se responsabilizar pela cobertura e pelo atendimento na área de saúde, de forma universal, é dizer, sem nenhum tipo de restrição.

A fixação pela Administração Pública de qualquer sorte de restrição quanto à cobertura e ao atendimento na área de saúde, portanto, revela-se inconstitucional, conclusão que se atinge não só pela leitura isolada desse dispositivo, mas também levando em consideração a necessidade de uma interpretação sistemática que preserve os valores fundamentais da vida e da dignidade da pessoa humana. Em outras palavras, reunindo-se os diversos dispositivos constitucionais até aqui analisados, chega-se à conclusão de que a universalidade da cobertura e do atendimento em matéria de saúde surge como potente instrumento para a consolidação do direito à vida, da dignidade da pessoa humana.

Oportuno aqui consignar que a diretriz constitucional menciona a universalidade não só do atendimento mas também da cobertura, o que traz, como corolário, a necessidade de o Estado se responsabilizar pelo atendimento de qualquer demanda nesse setor, apresentada, inclusive, por qualquer pessoa.

Esse último aspecto revela uma outra vertente das regras constitucionais a respeito desse tema, na medida em que autoriza a conclusão segundo a qual a responsabilidade do Estado se estende para as demandas apresentadas por qualquer pessoa, esteja ela contribuindo ou não, de alguma maneira, para esse sistema de Seguridade.

A obrigatoriedade da universalidade da cobertura e do atendimento pelo Estado só irá se materializar, repita-se uma vez mais, para aquelas situações intimamente relacionadas à manutenção da dignidade da pessoa humana, do direito à vida. Cumpre salientar que o raciocínio ora apresentado é o único capaz de extrair das regras constitucionais analisadas o máximo de eficácia possível, por se tratar aqui da preservação de direito constitucional primário, vale dizer, a vida, e de forma digna.

O art. 196 da CF preocupou-se em estabelecer que a saúde é um direito de todos e também um dever do Estado, preconizando as formas pelas quais esse serviço será garantido, nos termos a seguir demonstrados:
"Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação" (grifo nosso).

Dessa forma, quer-nos parecer que qualquer omissão do Estado no papel de garantidor desse direito abrirá ensejo para a propositura de medidas judiciais, desde que comprovado o nexo de causalidade. Em outras palavras, a possibilidade de responsabilização do Estado exsurge manifesta não somente naquelas situações em que ele não garantir o direito à saúde, mas também quando o assegurar de forma ineficiente.

Nesse particular, importante salientar que, quando se faz referência ao cumprimento de forma ineficiente do papel a ele atribuído pela Constituição, quer-se abranger aquelas hipóteses em que a saúde, embora assegurada, não o seja de forma igualitária e universal, quanto ao atendimento e à cobertura.

Deve-se enfatizar, ainda, que a garantia ao direito à vida de forma digna apresenta uma amplitude enorme, uma vez que inclui não só o acesso a tratamentos necessários para a sua preservação, mas também o oferecimento das drogas que se revelarem imprescindíveis para a sua manutenção.

Em razão dos dispositivos constitucionais analisados, nossos Tribunais, por força do caráter universal desse dever do Estado, têm sistematicamente acolhido pedidos nesse sentido.

Nossa Constituição preconizou a instituição de um Sistema Único de Saúde financiado com os recursos do orçamento da Seguridade Social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Esse aspecto assume enorme relevo, uma vez que tem servido para afastar as tentativas do Poder Público de se furtar a assumir essa responsabilidade sob a alegação de ilegitimidade de parte.

Nossos Tribunais têm entendido que, por se tratar de um sistema único, financiado pelas quatro pessoas integrantes de nossa Federação, seriam todas elas responsáveis por essas obrigações, por se tratar, também, de competência comum, a teor do disposto no art. 23, II, da CF, que a seguir se reproduz:

"Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:
[...]
II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;" .

Assim, a título de exemplificação, oportuno conferir excerto jurisprudencial relacionado ao fornecimento gratuito de medicamentos gratuitos pelo Poder Público:

"Direito à saúde. Fornecimento gratuito de medicamento. Lei n. 8.080/90.
1 - O direito à saúde está garantido na Constituição e a Lei n. 8.080/90 de 19 de setembro de 1990, é categórica ao estabelecer, em seu art. 2.º, o dever do Estado de prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício; 2 - A União Federal é responsável pelo fornecimento gratuito de medicamentos, não só por força de mandamento constitucional, inserto nos arts. 196 e 198 da Constituição Federal de 1988, como também por força do estatuído na Lei n. 8.080/90 àqueles que não tem condições de arcar com as despesas do tratamento; 3 - Precedentes do Eg. Superior Tribunal de Justiça no Resp. n. 21 2346/RJ (1999/0039005-9) e no ROMS n. 13452/MG (2001/0089015-2); 4 - Remessa necessária e recurso da União Federal a que se negam provimento" [11].

No mesmo sentido, encontramos os comentários de nossa melhor doutrina, representada pelo eminente jurista SÉRGIO PINTO MARTINS:

"Verifica-se que a saúde é um direito público subjetivo, que pode ser exigido do Estado, que, por contrapartida, tem o dever de prestá-la. Está, assim, entre os direitos fundamentais do ser humano" [12].

De outra parte, exsurge manifesta a responsabilidade do Estado na hipótese de caracterização de dano em decorrência de serviços prestados de forma deficiente. Confira-se:

"Dano moral. Indenização. Responsabilidade civil do Estado. Exame laboratorial, fornecido por ambulatório estadual, que apura que a paciente possui o vírus da AIDS. Comprovação posterior que o resultado não correspondia à verdade. Verba devida.
Impõe-se a reparação por dano moral, decorrente de exame laboratorial fornecido por ambulatório estadual que apura que a paciente possui o vírus da AIDS, sendo posteriormente constatado que tal resultado não correspondia à verdade.
Indenização. Dano material. Paciente que recebe resultado inverídico para AIDS. Inexistência da comprovação dos prejuízos patrimoniais. Verba indevida.
Inexistindo a comprovação de prejuízos patrimoniais é inadmissível o reconhecimento do dever de reparação a título de dano material ao paciente que recebe resultado positivo para AIDS, ainda que inverídico" [13].

"Responsabilidade civil do Estado. Erro médico. Vítima menor que após a internação em hospital público, para operação do apêndice, ficou tetraplégica, surda e muda. Pensão mensal e reparação por dano moral, na forma do art. 1.538 do CC, devidos pela União. Aplicação do art. 37, § 6.º, da CF.
Conforme dispõe o art. 37, § 6.º, da CF, a responsabilidade civil do Estado é de natureza objetiva. Assim, demonstrado o nexo causal entre lesão, erro médico ocorrido em uma operação de apendicite em hospital público, que deixou a vítima menor tetraplégica, surda e muda, e o ato do agente público, a União Federal responde pela pensão mensal à vítima e deve reparar, ainda, o dano moral na forma prevista no art. 1.538 do CC" [14].

"Responsabilidade civil do Estado. Indenização. Erro médico. Caracterização. Operação de sinusite ocorrida em hospital do extinto Inamps que teve como conseqüência a permanência em estado de coma da paciente e posteriormente um quadro infeccioso que gerou a necessidade de novas intervenções cirúrgicas - Verba devida independentemente de dolo ou culpa dos agentes da União.
Conforme estabelecido no art. 37, da CF, a responsabilidade do Estado é de natureza objetiva, e assim deve a União responder pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, independente da prova de dolo ou culpa, estando compreendido neste conceito o erro médico ocorrido em hospital do extinto Inamps por ocasião de uma operação de sinusite, que resultou na permanência em estado de coma da paciente e, posteriormente, em um quadro infeccioso que gerou a necessidade de novas intervenções cirúrgicas" [15].

Nesse contexto, as decisões colacionadas demonstram de forma cristalina que a vida, dom maior, não tem preço, mesmo para uma sociedade que perdeu o sentido da solidariedade. O reconhecimento do direito à sua manutenção, contudo, não tem balizamento caritativo, posto que carrega em si mesmo o selo da legitimidade constitucional e está ancorado em legislação obediente àquele comando. Nesse particular, cumpre observar que, em razão da importância conferida a esse direito, não se pode cogitar da possibilidade de o Estado deixar de prestá-lo na forma preconizada pela Constituição, ainda mais por força de aspectos financeiros.

Por outro lado, nem se diga que essas normas relacionadas à saúde teriam caráter programático demandando, pois, regulamentação posterior para sua utilização, uma vez que implicaria esvaziamento inaceitável de seu conteúdo. Aliás, esse aspecto foi enfrentado com maestria pelo Min. EROS ROBERTO GRAU, quando observou:

"Ao aceitarmos, pacificamente, a existência de direitos sem garantias, alinhamo-nos, conscientemente ou inconscientemente, entre aqueles que concebem - inconsciente ou conscientemente, também - esteja a Constituição integrada por fórmulas vazias, desprovidas de valor jurídico.
Cumpre reconhecer, assim, que a Constituição é, toda ela, norma jurídica e, como tal, todos os direitos nela contemplados têm aplicação direta, vinculando tanto o Judiciário, quanto o Executivo, como o Legislativo.
Sustento, nestas condições, que as normas constitucionais programáticas, sobretudo - repita-se - as atributivas de direitos sociais e econômicos, devem ser entendidas como diretamente aplicáveis e imediatamente vinculante do Legislativo, do Executivo e do Judiciário" [16].

Em outras palavras, analisando os dispositivos Constitucionais sob o foco do princípio da efetividade, é absurda a concepção da existência de normas sem um mínimo de densidade para assegurar o exercício dos direitos ali previstos. Assim, todas as normas constitucionais, pelo princípio da efetividade, devem ser entendidas pela ótica que lhes dê maior eficácia e aplicabilidade, como visto.

Aceitar a idéia de que os dispositivos constitucionais relacionados à saúde são de caráter programático e que sua aplicabilidade depende de norma regulamentadora significa dizer que a eficácia do Texto Constitucional está subordinada a uma norma hierarquicamente inferior no sistema jurídico, o que não se admite.

Da mesma maneira, não se pode cogitar da possibilidade de a utilização desse direito ficar atrelada a normas e procedimentos fixados pelo Ministério da Saúde, pois os entes federativos (União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios) antes se subsumem à Constituição Federal (arts. 196 e 198, § 1.º, da CF).

A respeito do tema, pontificou o Min. CELSO DE MELLO, do Supremo Tribunal Federal (STF), no RE n. 267.612/RS, verbis:

"Na realidade, o cumprimento do dever político-constitucional consagrado no art. 196 da Lei Fundamental do Estado, consistente na obrigação de assegurar, a todos, a proteção à saúde, representa fator, que, associado a um imperativo de solidariedade social, impõe-se ao Poder Público, qualquer que seja a dimensão institucional em que atue no plano de nossa organização federativa.
Tal como pude enfatizar, em decisão por mim proferida no exercício da Presidência do Supremo Tribunal Federal, em contexto assemelhado ao da presente causa (Pet. n. 1.246/SC), entre proteger a inviolabilidade do direito à vida e à saúde, que se qualifica como direito subjetivo inalienável assegurado a todos pela Constituição da República (art. 5.º, caput, e art. 196), ou fazer prevalecer, contra essa prerrogativa fundamental, um interesse financeiro e secundário do Estado, entendo - uma vez configurado esse dilema - que razões de ordem ético-jurídica impõem ao julgador uma só e possível opção: aquela que privilegia o respeito indeclinável à vida e à saúde humana, notadamente daqueles, como os ora recorridos, que têm acesso, por força de legislação local, ao programa de distribuição gratuita de medicamentos, instituído em favor de pessoas carentes.
A legislação gaúcha - consubstanciada nas Leis n. 9.908/93, n. 9.828/93 e n. 10.529/95 -, ao instituir esse programa de caráter marcadamente social, da efetividade a preceitos fundamentais da Constituição da República (arts. 5.º, caput, e 196), representa, na concreção do seu alcance, um gesto reverente e solidário de apreço à vida e à saúde das pessoas, especialmente daquelas que nada possuem, a não ser a consciência de sua própria humanidade e de sua essencial dignidade.
Cumpre não perder de perspectiva que o direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República. Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas que visem a garantir, aos cidadãos, o acesso universal e igualitário à assistência médico-hospitalar.
O sentido de fundamentalidade do direito à saúde - que representa, no contexto da evolução histórica dos direitos básicos da pessoa humana, uma das expressões mais relevantes das liberdades reais e concretas - impõe ao Poder Público um dever de prestação positiva que somente se terá por cumprido, pelas instâncias governamentais, quando estas adotarem providências destinadas a promover, em plenitude, a satisfação efetiva da determinação ordenada pelo texto constitucional" [17].

Merece destaque o voto proferido pelo Min. MARCO AURÉLIO DE MELLO em relação à necessidade de o Estado assumir seus deveres constitucionais quanto à prestação do serviço de saúde, não podendo utilizar, como impeditivo, problemas de ordem orçamentária. Confira-se:

"O Estado deve assumir as funções que lhe são próprias, sendo certo, ainda, que problemas orçamentários não podem obstaculizar o implemento do que previsto constitucionalmente. Por tais razões, não conheço deste extraordinário. É o meu voto" [18].

A respeito desse tema, veja-se ainda a transcrição do voto proferido pelo Min. CELSO DE MELLO:

"O sentido de fundamentalidade do direito à saúde - que representa, no contexto da evolução histórica dos direitos básicos da pessoa humana, uma das expressões mais relevantes das liberdades reais ou concretas - impõe ao Poder Público um dever de prestação positiva que somente se terá por cumprido, pelas instâncias governamentais, quando estas adotarem providências destinadas a promover, em plenitude, a satisfação efetiva da determinação ordenada pelo texto constitucional.
Não basta, portanto, que o Estado meramente proclame o reconhecimento formal de um direito. Torna-se essencial que, para além da simples declaração constitucional desse direito, seja ele integralmente respeitado e plenamente garantido, especialmente naqueles casos em que o direito - como o direito à saúde - se qualifica como prerrogativa jurídica de que decorre o poder do cidadão de exigir, do Estado, a implementação de prestações positivas impostas pelo próprio ordenamento constitucional" [19].

Nesse sentido, sobreleva notar que a discussão a respeito de serem ou não as regras relacionadas à saúde normas programáticas ou de eficácia imediata perde totalmente o sentido. Nenhuma regra de hermenêutica pode sobrepor-se ao princípio maior estabelecido na Constituição em vigor, que preserva o direito à saúde como forma de assegurar a todos uma vida digna.

Nesse contexto, de fundamental importância a transcrição do voto proferido pelo ilustre Des. SALVADOR HORÁCIO VIZZOTTO, relator do MS n. 596159988, que passo a transcrever, in verbis:

"Então, da conjugação das apontadas disposições constitucionais, interpretadas de modo conjugado e sistemático, resulta cristalino, que o direito à vida, à saúde, à integridade física e assim à dignidade da pessoa, está garantido objetivamente pelo direito material, residindo com o Estado a obrigação de assegurá-lo, independentemente de qualquer vinculação da pessoa a sistema de seguridade social, descabendo falar, em normas programáticas, como querem alguns e é sustentado nesta ação. A natureza programática das normas inferiores e de sustentação da norma fundamental insculpida no caput do art. 5.º, da Lei Maior, a meu sentir, é aparente e diz respeito apenas à complexa estrutura organizacional e funcional do Estado Brasileiro, mas, evidentemente, não pode frustrar e, desse modo invalidar, o comando maior, para através de mecanismos de ordem meramente formal e burocrática, invalidá-lo. O Poder Executivo, das três esferas de governo, haverá de se mostrar apto e competente para cumprir o direito que tem, à saúde e, assim, à vida, os seus jurisdicionados, como assegura a Constituição Federal, no capítulo que trata dos direitos e garantias fundamentais, especialmente, no caput do art. 5.º, como, de resto, já sustentou, perante o colendo Primeiro Grupo Cível e em outros feitos, o eminente Desembargador Tupinambá Miguel Castro do Nascimento (MS n. 592140180).

Todos têm direito à vida e, assim, à saúde, constituindo obrigação inarredável do Estado assegurá-lo, independentemente de qualquer vinculação do necessitado a sistema de seguridade social, na forma do disposto nos arts. 5.º, caput, 6.º, 196 e 203 da Constituição Federal e da Lei Estadual n. 9.908/93, porquanto a vida e a saúde constituem a fonte fundamental e primeira de todos os outros bens jurídicos. Segurança concedida" [20].

Em síntese, pois, tem-se que, por força dos excertos doutrinários e jurisprudenciais colacionados, a questão relacionada à saúde merece tratamento diferenciado, ainda mais quando está em jogo o direito à vida, que, infelizmente, como a morte, segue seu curso e não espera a lenta tramitação da Justiça.


Notas do texto:


[1] CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1991. p. 162.

[2] BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 185.

[3] Tribunal Constitucional Federal Alemão. In: BARROSO, Luís Roberto. Op. cit. p. 182.

[4] HESSE, Konrad apud BARROSO, Luís Roberto. Loc. cit.

[5] Op. cit. p. 162.

[6] Manual de direito constitucional. 2. ed. Coimbra: Coimbra, 1983. t. 2, p. 229.

[7] Elementos de direito constitucional da República Federativa da Alemanha. Tradução de Luiz Afonso Heck. Porto Alegre: SAFE, 1998. p. 109-111.

[8] Manual de direito constitucional. 2. ed. Coimbra: Coimbra, 1988. t. 4, p. 166-167.

[9] Teoria Constitucional da Democracia Participativa. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 233.

[10] AgRg no RE n. 271.286-8/RS, rel. Min. Celso de Mello, j. Em 12.9.2000, Boletim de Direito Administrativo, ago. 2001, p. 641.

[11] TRF, 2.ª Região, 5.ª T., AMS n. 2002. 02.010009024-5/RJ, rel. Des. Federal Antônio Ivan Athié, v. u., j. em 11.3.2003, DJU de 28.3.02003, p. 460.

[12] Direito da seguridade social. 9. ed. São Paulo: Atlas, 1998. p. 428.

[13] TJSP, 8.ª Câm. de Dir. Públ., AC n. 049.742-5/2-00/Guarulhos, rel. Des. Paulo Travain, v. u., j. em 9.12.1999, RT 778/246.

[14] TRF, 2.ª Região, 2.ª T., AP n. 97.02.17297-7/RJ, rel. Des. Federal Paulo Espírito Santo, v. u., j. em 8.9.1999, RT 775/402.

[15] TRF, 2.ª Região, 2.ª T., AC n. 99.02.20871-1/RJ, rel. Des. Federal Castro Aguiar, v. u., j. em 3.5.2000, RT 783/445.

[16] Direitos, conceitos e normas jurídicas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998. p. 125-126.

[17] Excertos do Ac. do TJSP, 3.ª Câm. de Dir. Públ., AgI n. 200.036-5/0-00, rel. Magalhães Coelho, j. em 28.8.2001.

[18] RE n. 195.192-3/RS, j. em 22.2.2000.

[19] RE n. 232.335/RS.

[20] TJRS, 1.º Grupo de Câms. Cívs., j. em 1.º.11.1996.


Crédito: Escritório Online.

http://www.escritorioonline.com/webnews/noticia.php?id_noticia=7004&

domingo, 16 de novembro de 2008

Mulher traída ganha indenização da amante do ex-marido em Goiânia.

Uma mulher traída conseguiu na Justiça de Goiás o direito de receber da amante do seu ex-marido uma indenização de pouco mais de R$ 31 mil por danos morais. A decisão é da primeira instância e a amante, portanto, ainda pode recorrer.

A professora Fátima Cristina Oliveira acreditava numa união de 21 anos, e seu marido, segundo ela, era "acima de qualquer suspeita". "Era uma pessoa caseira. Era sete da noite e ele já estava em casa", recorda.

Um telefonema, porém, mudou a vida da professora. Ela descobriu que estava sendo traída e a notícia chegou pela própria amante. Fátima entrou em depressão, e, desorientada, ficou sem o emprego.

Quando tudo parecia perdido, ela decidiu reagir. A professora entrou na Justiça contra amante, alegando danos morais. Primeiro, ela tentou salvar o casamento, mas preferiu o divórcio depois que percebeu que o marido pagava as despesas do advogado da amante.

Sem condições emocionais de continuar morando em Goiânia, Fátima recomeçou a vida em outro lugar, a 200 km de distância: foi para Brasília, onde morou antes do casamento. Arrumou um novo emprego e até voltou a estudar, enquanto aguardava uma decisão sobre o processo na Justiça de Goiânia.

75 salários mínimos

Na sentença, o juiz condenou a amante a pagar indenização de 75 salários mínimos, ou seja R$ 31.125,00. Ele justificou a decisão com base nas ameaças que a amante teria feito contra a professora e no sofrimento pelo qual Fátima havia passado.

A amante, que trabalha como vendedora, não foi encontrada em casa para falar sobre o assunto.

Alerta

O advogado da professora acredita que a decisão do juiz abre precedente jurídico para outros casos. "A decisão basta para realmente quebrar barreiras", disse Éder Francelino Araújo. Ele também alerta aqueles que andam traindo os parceiros. "Amantes que se cuidem!", afirmou. (Com informações do Jornal da Globo).

Crédito: http://www.espacovital.com.br/noticia_ler.php?idnoticia=12849

Refrigerante com patas de inseto e massa cinzenta.

Consumidores que encontraram parte de inseto dentro de garrafa de refrigerante serão indenizados pela empresa Vonpar Refrescos S/A em R$ 6 mil por danos morais. A decisão é da 9ª Câmara Cível do TJRS, reformando sentença que julgara o pedido improcedente.

Os autores da ação - Rodrigo da Silva Machado e Luciane Santoni - narraram que, em maio de 2005, almoçavam com os amigos em um restaurante, em sua cidade, tendo pedido para beber Coca-Cola em garrafa. Após ter ingerido grande parte do refrigerante, um deles sentiu algo estranho na boca.

Os consumidores comprovaram ter chamado o garçom e o gerente do estabelecimento para identificar "os objetos estranhos contidos na Coca-Cola", sendo apurado que se tratava de "partes de um inseto, como pequenas patas e massa cinzenta", o que ficou demonstrado nas fotografias acostadas aos autos.

Na sentença, o juiz Carlos Alberto Ely Fontela, da 2ª Vara Cível de Santo Ângelo, dispôs que "o simples fato de existir algo estranho na bebida não é capaz de provocar um abalo emocional relevante ao ´homo medius´”.

Em recurso de apelação ao TJ, os consumidores alegaram que "o ocorrido causou constrangimento, repulsa e apreensão", salientando que amigos e demais clientes presenciaram o fato.

A Vonpar sustentou - na contestação e nas contra-razões de apelação - que "o mero desagrado da ingestão do refrigerante não é capaz de causar abalo moral indenizável e que não há qualquer indício de que o objeto encontrado fosse nocivo à saúde". Defendeu ainda que não restaram comprovados a humilhação e o constrangimento alegadamente sofridos.

Para o relator, desembargador Odone Sanguiné, "não há dúvida de que o produto é defeituoso, uma vez que não houve contestação da ré nesse sentido". Além disso, ficou provado que a garrafa - cujo refrigerantes continha partes de um inseto - foi aberta na frente dos clientes.

No entendimento do magistrado, "o fato é passível de causar abalo de ordem psíquica à pessoa, já que a preocupação com a saúde e o bem-estar é característica inerente à pessoa humana". O voto destaca que "era dever da empresa oferecer um produto de qualidade, sendo o abalo moral presumível, mesmo que os autores não tenham apresentado problemas de saúde".

Proc./AP nº 70024087181 - com informações do TJRS e da redação do Espaço Vital.

http://www.espacovital.com.br/noticia_complementos.php?idcomp=1233

sábado, 15 de novembro de 2008

Um advogado morreu e foi para o inferno. Um mês depois, São Pedro recebe uma carta do Capeta, encaminhando o advogado. A carta dizia:"Devolvo, com o presente, a alma do causídico Fulano de tal, por absoluta impossibilidade de mantê-lo sob meu domínio, pelas razões que seguem: Ele abriu um escritório trabalhista e convenceu os capetinhas a ingressarem com ações trabalhistas pedindo insalubridade, periculosidade, etc. Depois, ingressou com uma ação direta de inconstitucionalidade junto ao Supremo Tribunal Infernal alegando excesso de concentração de poder contra mim. Pra terminar, ele abriu uma imobiliária, loteou o Inferno e começou a vender as possessões satânicas em módicas e suaves prestações."

Crédito: http://www.hugomeira.com.br/2008/05/piadas-de-advogado.html

Vejam como a ação de um advogado é libertadora! Age em nome dos direitos e a favor da liberdade.

=D


Charge de Angeli.
Crédito: http://piauijuridico.blogspot.com/2008_08_01_archive.html

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Polícia ouvirá hoje demais participantes da festa em que adolescente foi estuprada em Santa Catarina.

A polícia deve ouvir hoje (14) alguns dos participantes da festa na qual uma adolescente de 15 anos foi estuprada em Joaçaba (SC). Os três jovens suspeitos do crime poderão ser enquadrados por fornecimento de bebida alcoólica a menor, divulgação de imagem íntima de adolescente na Internet e estupro.

Diogo Chaves e Guilherme Augusto Trentin da Silva, ambos de 18 anos e estudantes de Administração da Universidade do Oeste de Santa Catarina (Unoesc), foram encaminhados ao Presídio Regional de Joaçaba após terem a prisão preventiva decretada. Um adolescente de 16 anos, que freqüenta o ensino médio e que também teria participado do abuso sexual e da filmagem das cenas, foi levado ao Centro de Internamento Provisório.

Segundo o jornal Diário Catarinense, em interrogatório ontem (13) os dois envolvidos adultos assumiram o crime. Um dos jovens de 18 anos não confessou o estupro, mas a participação dele aparece nas imagens e foi confirmada pelos outros dois participantes. Conforme a polícia, a confissão do trio ocorreu antes da prisão, nas conversas e e-mails trocados pela Internet. Após o crime, a garota foi levada pela família para Florianópolis.

"Temos todos os tipos de prova nesse procedimento, as imagens da violência sexual, as fotografias do estupro e também a confissão oficial na presença dos pais e de advogados" - disse o delegado regional de Joaçaba, Ademir Tadeu de Oliveira. A pena inicial por estupro é de seis anos, e pode chegar a 10 pela veiculação do conteúdo na Internet e pelo fornecimento de bebida alcoólica à garota. O inquérito deve ser entregue à Justiça ainda nesta semana.

Contraponto

Para o advogado Éder Marcelo, que trabalha na defesa de dois jovens, as imagens tornam indiscutível a presença dos clientes na relação sexual. "Se alguém fez algo errado, precisa pagar; mas deve pagar pelo que efetivamente fez, e não por aquilo que as pessoas estão comentando que os meus clientes poderiam ter feito; é aquele ditado popular, nem tudo o que reluz é ouro" - disse Marcelo.

A defesa do outro suspeito é feita pelo advogado Ricardo Nodari, que nega a participação do cliente na violência sexual. "Ele apenas filmou a cena, não se envolveu com a garota. Gravar as imagens foi uma atitude impensada de um rapaz que recém fez 18 anos. Não foi algo planejado, foi impulsivo. Os garotos são imaturos, não tinham noção do crime que estavam cometendo" - explica Nodari.

Dois casos semelhantes no país em 2008

* Maio - Itanhém (983 km de Salvador, BA) - O pai de uma garota de 13 anos (ele carpinteiro que mora nos EUA), recebeu por e-mail 54 imagens da agressão sofrida pela filha. O crime é investigado na CPI da Pedofilia

* Junho - São Gonçalo dos Campos (108 km de Salvador, BA) - Uma estudante de 16 anos, do interior da Bahia, denunciou cinco colegas de escola. Segundo a garota, o grupo a havia estuprado quatro vezes e colocado as imagens da agressão na rede.

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Câmara estuda projeto que pune também advogado por litigância de má-fé.

A Câmara dos Deputados analisa o Projeto de Lei nº 4074/08, do deputado Juvenil (PRTB-MG), que pune advogados por litigância de má-fé e aumenta o valor atual da multa nesses casos.
Atualmente, são punidos apenas os litigantes com multa de 1% do valor da causa. O deputado Juvenil quer aumentar esse valor para 5%. A proposta altera o Código de Processo Civil (Lei nº 5.869/73).

O projeto prevê que o juiz ou o tribunal "poderão condenar o litigante de má-fé e seu advogado, de ofício, ou a pedido da parte prejudicada". Além da multa, os litigantes deverão indenizar a outra parte por eventuais prejuízos e pagar os honorários advocatícios.

Segundo o autor da proposta legislativa, o objetivo é coibir ações indevidas na Justiça. O parlamentar explica que "incluiu o advogado entre aqueles passíveis de punição, porque, muitas vezes, as más condutas no processo judicial não são provocadas pelo litigante, que desconhece aspectos técnicos e jurídicos do Judiciário".

O projeto, que tramita em caráter conclusivo, será examinado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.

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http://www.espacovital.com.br

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Juiz não é obrigado a enfrentar matérias sob o enfoque pretendido pelas partes.

Em dois julgados recentes, a 4ª Turma do TRT-MG se manifestou sobre a utilização excessiva e, o mais das vezes, equivocada, do recurso de embargos de declaração, que tem limites estreitos e finalidade precisa expressa no artigo 535 do CPC, qual seja, sanar obscuridade, contradição ou omissão nas decisões judiciais.

O desembargador Júlio Bernardo do Carmo, relator de ambos os recursos embargados, salientou, em seu voto, que o instrumento não se presta à formulação de quesitos a serem obrigatoriamente respondidos pelo juiz: “Os Embargos Declaratórios constituem recurso de sede limitada e estreita (CPC, art. 535) não se prestando, assim, ao impertinente estabelecimento do jogo de perguntas e respostas. Tal recurso tipifica expediente processual disponível para esclarecer, aperfeiçoar, explicitar e completar a decisão e não para alterar, rediscutir ou impugnar o seu conteúdo”.

Noutro julgado, o desembargador destaca decisão do Superior Tribunal de Justiça, em voto da lavra do Ministro José Delgado, que assim se pronunciou sobre a matéria: “O não-acatamento das teses contidas no recurso não implica cerceamento de defesa, uma vez que ao julgador cabe apreciar a questão de acordo com o que ele entender atinente à lide. Não está obrigado o magistrado a julgar a questão posta a seu exame de acordo com o pleiteado pelas partes, mas sim com o seu livre convencimento (art. 131 do CPC), utilizando-se dos fatos, provas, jurisprudência, aspectos pertinentes ao tema e da legislação que entender aplicável ao caso”.

O desembargador esclarece que, para efeitos de preqüestionamento da matéria (que é requisito para o conhecimento do recurso de revista pelo TST), basta que a decisão combatida tenha expressado tese explícita a respeito da questão discutida (Súmula 297, do TST). “O preqüestionamento, nada mais é, do ponto de vista jurídico, do que a suscitação prévia de uma tese jurídica defendida. Se 'pré-questionar' é, como é lógico, questionar previamente, o requisito estará atendido simplesmente com o singelo fato da matéria ter sido realmente ventilada e decidida pelo órgão ao qual submetida” - pontua.

Ou seja, os embargos de declaração só serão procedentes nos casos em que a prestação jurisdicional tiver sido imperfeita, seja por obscuridade, contradição ou omissão específica quanto à matéria suscitada. Não serve, portanto, para rediscutir ou protestar contra a decisão embargada.

Em ambos os casos, entendendo que as reclamadas pretendiam revolver matérias já decididas, o relator negou provimento aos embargos declaratórios.

(00397-2008-135-03-00-0-ED - 22.10.08)
(nº 00225-2008-089-03-00-0)
Fonte: TRT 3

Crédito: http://www.editoramagister.com

Compete aos tribunais de origem determinar efeito suspensivo a recurso extraordinário com repercussão geral.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) analisou na tarde de ontem (12) questão de ordem em Ação Cautelar (AC 2177), requerida pela Usina Trapiche S/A contra a União. A Usina pretendia a concessão de efeito suspensivo a recurso extraordinário interposto contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça que deu o provimento ao recurso especial da União e considerou que o crédito-prêmio do IPI foi extinto em 1990.

A autora sustentou que o Supremo, ao apreciar as Reclamações 6162 e 6288, suspendeu preliminarmente o efeito de decisões do STJ que trataram do mesmo assunto, tendo em vista o seu caráter constitucional.

A ação cautelar foi proposta no STJ, o qual declinou da competência por entender impossível a realização do primeiro juízo de admissibilidade do recurso extraordinário, já que reconhecida a repercussão geral da matéria pelo Supremo no julgamento do RE 577302. Assim, a ação foi remetida ao STF.

Julgamento

Por maioria de votos, os ministros entenderam que compete ao tribunal onde foi interposto o RE conhecer e julgar ação cautelar, podendo conferir efeito suspensivo, quando for reconhecida repercussão geral sobre a questão e sobrestado recurso extraordinário admitido ou não na origem. Por conseqüência, o STF considerou-se incompetente para analisar a matéria e determinou a devolução dos autos ao STJ, vencidos os ministros Marco Aurélio e Cármen Lúcia Antunes Rocha.

Anteriormente, para a concessão de efeito suspensivo pela Suprema Corte, era necessário que o recurso extraordinário fosse admitido ou que o agravo de instrumento fosse provido no caso de juízo negativo de admissibilidade. Sobre o tema, o Supremo editou as Súmulas 634 e 635.

A relatora da AC, ministra Ellen Gracie, concluiu que a forma de fixação da competência cautelar já estabelecida pelo Supremo está de acordo com o instituto da repercussão geral. Conforme a ministra, a modificação dessa situação seria preocupante por ser diferenciada aos recursos com acórdãos publicados antes de 3 de maio de 2007, data em que se passou a exigir a comprovação da repercussão geral, “bem como mesmo aqueles posteriores a essa data, mas com matéria cuja repercussão geral ainda não tenha sido apreciada pelo Plenário Virtual”.

A ministra considerou de extrema relevância que o Supremo reafirme o seu posicionamento nas Súmulas 634 e 635 quanto à competência de todos os tribunais e turmas recursais de origem para analisar pedidos cautelares decorrentes da interposição de recursos extraordinários “mesmo após o sobrestamento introduzido pelo artigo 543-B parágrafo 1º do CPC e pelo artigo 328-A do Regimento Interno do STF”.

“Estamos ainda construindo o instituto da repercussão geral. É um instituto novo que vai nos causar surpresas aqui e ali com fatos novos, demandas e necessidades das partes que irão surgindo, de modo que essa construção jurisprudencial nos permite nesta hipótese avançarmos um pouco mais e sinalizarmos qual é a orientação do Tribunal nessa matéria” disse a relatora. Ela lembrou que uma vez reconhecida a repercussão geral a competência cautelar é sempre do tribunal de origem.

Repercussão geral

De acordo com a ministra Ellen Gracie, a repercussão geral foi criada pela Emenda Constitucional nº 45, em razão do crescimento preocupante do volume de recursos extraordinários interpostos. A norma estabeleceu um novo requisito para admissibilidade desse instrumento.

“Para que a Casa não fosse mais obrigada a se manifestar centenas de vezes sobre a mesma matéria, a repercussão geral possibilitou, após a inclusão do feito no Plenário Virtual, tanto o sobrestamento dos demais processos que versem sobre aquele tema como a aplicação pelos tribunais a quo da decisão emanada do Supremo Tribunal Federal aos demais recursos”, ressaltou a ministra.

Números

A ministra informou que 132 assuntos já foram submetidos ao Plenário Virtual, 106 matérias tiveram reconhecida a repercussão geral e 30.408 processos retornaram à instância anterior após o reconhecimento da repercussão geral. “Ainda teríamos que acrescentar todos os demais que estão sobrestados nos tribunais de origem”.

Ellen Gracie esclareceu que , após o reconhecimento da repercussão geral pelo STF, os tribunais de origem devem sobrestar os recursos extraordinários.


Fonte: STF

Crédito: http://www.editoramagister.com/noticia_ler.php?id=32551&page=1

Tribunal condena Estado do Rio por furto de automóvel

A 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça condenou o Estado do Rio a pagar R$ 8 mil de indenização por danos materiais ao coronel da PM Carlos Roberto Varella. Indignado com o furto de seu automóvel, que ocorreu dentro estacionamento do Hospital Adão Pereira Nunes, em Duque de Caxias, Baixada Fluminense, Carlos resolveu ajuizar uma ação contra o Estado.

De acordo com ele, em 12 de fevereiro de 2004, seu genro, que é enfermeiro do hospital, pegou seu carro emprestado para trabalhar e ao sair do plantão, no dia seguinte, descobriu que o veículo havia sumido. A empresa de vigilância que presta serviço ao Estado já havia, inclusive, chamado a atenção da administração pública para as péssimas condições do local, como falta de iluminação, vegetação mal podada, número insuficiente de vigilantes e ausência de barreiras ao redor do estacionamento. Porém, nenhuma medida foi tomada.

"Sua responsabilização pelo evento é indiscutível seja porque acolhera o veículo de propriedade do autor em área privativa e reservada ao estacionamento dos veículos de seus funcionários, sob sua proteção e guarda, seja porque as providências que adotara a respeito da respectiva segurança, repassando-a a terceiro, não se mostraram eficientes aos respectivos fins, tamanha a vulnerabilidade da área tantas vezes denunciada por sua contratada", explicou o relator do processo, desembargador Maurício Caldas.
Fonte: TJRJ


Crédito:
http://www.editoramagister.com/noticia_ler.php?id=32542&page=1

Direitos da(o) Amante na Teoria e na Prática (dos Tribunais)

Pablo Stolze Gagliano
Juiz de Direito na Bahia; Pós-Graduado em Direito Civil pela Fundação Faculdade de Direito da Bahia; Mestre em Direito Civil pela PUC-SP; Professor de Direito Civil da Universidade Federal da Bahia e da Rede LFG.

SUMÁRIO: 1 Introdução; 2 As Relações Paralelas de Afeto; 3 O Papel da Fidelidade; 4 O Poliamorismo; 5 Relação de Concubinato e Direitos da(o) Amante; 6 A(o) Amante e o Supremo Tribunal Federal; 7 Conclusões e Conselho.

1 Introdução

Você seria capaz de amar duas pessoas ao mesmo tempo?

Esta indagação, quando nos referimos ao amor que une os casais, costuma surpreender o interlocutor, o qual, por vezes, culmina por tentar buscar – ainda que em breve (e quase imperceptível) esforço de memória –, em sua história de vida, na infância ou na adolescência, algum fato caracterizador desta complexa "duplicidade de afeto".

Pondo um pouco de lado o aspecto eminentemente moral que permeia o tema, é forçoso convir que a infidelidade e os amores paralelos fazem parte da trajetória da própria humanidade, acompanhando de perto a história do casamento.

Machado de Assis que o diga.

Por isso, não se afirme que a discussão, em nível jurídico, dos direitos da(o) amante traduz a frouxidão dos valores morais de nosso tempo, pois, se crise ética e valorativa há no mundo de hoje – e, de fato, creio existir – deriva, sem dúvida, de outros fatores (sucateamento do ensino, desigualdade social ainda acirrada, níveis alarmantes de insegurança pública, falta de visão filosófica e espiritual da vida), e não da infidelidade em si, que, conforme dissemos, é assunto dos mais antigos.

O fato é que, hoje em dia, a doutrina e a jurisprudência, sob o importante influxo da promoção constitucional da dignidade humana, resolveram enfrentar a matéria.

2 As Relações Paralelas de Afeto

A amante saiu do limbo jurídico a que estava confinada.

E, retornando à indagação feita, vale constatar que existe um número incalculável de pessoas, no Brasil e no mundo, que participam de relações paralelas de afeto.

Ainda que não seja a nossa pessoal situação, amigo(a) leitor(a), todos nós conhecemos ou sabemos de alguém, às vezes até parente ou amigo próximo, que mantém relação de concubinato 1.

Não é verdade?

Aliás, a matemática da infidelidade no Brasil não mente:

"As mulheres avançam, é verdade. Mas homens ainda reinam absolutos. A traição é em dobro: para cada mulher que trai, há dois homens sendo infiéis. Uma pesquisa do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo mostra que um dos índices menores é o do Paraná, mas é onde 43% dos homens já traíram. Em São Paulo, 44%. Em Minas Gerais, 52%. No Rio Grande do Sul, 60%. No Ceará, 61%. Mas os baianos são os campeões: 64% dos homens se dizem infiéis. Música e sensualidade formam uma mistura que, em Salvador, é sempre bem apimentada." 2

Na mesma linha, o site oficial do Ministério da Saúde:

"Os baianos são os campeões quando o assunto é traição. Já os paranaenses se dizem os mais fiéis. Entre as mulheres, as fluminenses são as que mais assumem ter casos extraconjugais. Quando se trata de freqüência de relações sexuais por semana, os homens de Mato Grosso do Sul e as mulheres de Pernambuco lideram a lista. Os dados são resultado de uma pesquisa liderada pela psiquiatra Carmita Abdo, coordenadora do Projeto Sexualidade (ProSex) do Hospital das Clínicas de São Paulo." 3

Com isso, é lógico concluir a provável existência de inúmeras realidades paralelas ao casamento ou à união estável em nosso país.

Imaginemos, pois, nessa linha de intelecção, que um homem 4 seja casado e mantenha, há alguns anos, uma relação simultânea com uma amante.

Vive com a esposa, mantém a sociedade conjugal, mas, uma ou duas vezes na semana, está com a sua concubina.

Pergunta-se, pois: o Direito deverá tutelar ambas as relações (a travada com a esposa e a mantida com a amante)?

E mais: caso seja afirmativa a resposta, esta tutela decorrerá da atuação das normas do Direito de Família?

Duas perguntas dificílimas de serem respondidas.

Para tentarmos chegar a uma solução, é necessário que analisemos o papel da fidelidade no ordenamento jurídico brasileiro.

3 O Papel da Fidelidade

Pensamos que a fidelidade é (e jamais deixará de ser) um valor juridicamente tutelado, e tanto o é que fora erigido como dever legal decorrente do casamento ou da união estável:

"Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges:

I – fidelidade recíproca;

II – vida em comum, no domicílio conjugal;

III – mútua assistência;

IV – sustento, guarda e educação dos filhos;

V – respeito e consideração mútuos.

(...)

Art. 1.724. As relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade 5, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos." (grifos nossos)

Aliás, a violação deste dever, aliada à insuportabilidade da vida em comum, poderá, segundo norte pretoriano, resultar na dissolução da sociedade conjugal ou da relação de companheirismo, com conseqüências inclusive indenizatórias 6.

Com isso, no entanto, não se conclua que, posto a monogamia seja uma nota característica do nosso sistema 7, a fidelidade traduza um padrão valorativo absoluto.

O Estado, à luz do princípio da intervenção mínima no Direito de Família, não poderia, sob nenhum pretexto, impor, coercitivamente, a todos os casais, a estrita observância da fidelidade recíproca.

A atuação estatal não poderia invadir esta esfera de intimidade, a exemplo do que se dá na "relação de poliamor".

4 O Poliamorismo

O que dizer, nessa linha de pensamento, do casal que vive em poliamorismo?

O poliamorismo ou poliamor, teoria psicológica que começa a descortinar-se para o Direito, admite a possibilidade de co-existirem duas ou mais relações afetivas paralelas, em que os seus partícipes conhecem e aceitam uns aos outros, em uma relação múltipla e aberta.

Segundo a psicóloga Noely Montes Moraes, professora da PUC-SP, "a etologia (estudo do comportamento animal), a biologia e a genética não confirmam a monogamia como padrão dominante nas espécies, incluindo a humana. E, apesar de não ser uma realidade bem recebida por grande parte da sociedade ocidental, as pessoas podem amar mais de uma pessoa ao mesmo tempo" 8.

Pois é, caro leitor.

Por mais que este não seja o padrão comportamental da nossa vida afetiva, trata-se de uma realidade existente, e que culmina por mitigar, pela atuação da vontade dos próprios atores da relação, o dever de fidelidade.

Há, inclusive, notícia da jurisprudência neste sentido:

"A 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça reconheceu que um cidadão viveu duas uniões afetivas: com a sua esposa e com uma companheira. Assim, decidiram repartir 50% do patrimônio imóvel, adquirido no período do concubinato, entre as duas. A outra metade ficará, dentro da normalidade, com os filhos. A decisão é inédita na Justiça gaúcha e resultou da análise das especificidades do caso. (...) Para o Desembargador Portanova, ‘a experiência tem demonstrado que os casos de concubinato apresentam uma série infindável de peculiaridades possíveis’. Avaliou que se pode estar diante da situação em que o trio de concubino esteja perfeitamente de acordo com a vida a três. No caso, houve uma relação ‘não eventual’ contínua e pública, que durou 28 anos, inclusive com prole, observou. ‘Tal era o elo entre a companheira e o falecido que a esposa e o filho do casamento sequer negam os fatos – pelo contrário, confirmam; é quase um concubinato consentido’. O Desembargador José Ataídes Siqueira Trindade acompanhou as conclusões do relator, ressaltando a singularidade do caso concreto: ‘Não resta a menor dúvida que é um caso que foge completamente daqueles parâmetros de normalidade e apresenta particularidades específicas, que deve merecer do julgador tratamento especial’." 9

Assim, podemos concluir que, posto a fidelidade seja consagrada como um valor juridicamente tutelado, não se trata de um aspecto comportamental absoluto e inalterável pela vontade das partes.

Muito bem.

E o que dizer, portanto, quando apenas uma das partes rompe este dever, caracterizando a denominada relação de concubinato entre os amantes?

5 Relação de Concubinato e Direitos da(o) Amante

Haveria, neste caso, e aqui voltamos à nossa intrigante questão, relação juridicamente tutelável entre a pessoa, casada ou em união estável, e a(o) sua(seu) amante?

Tudo dependerá da minuciosa análise do caso concreto.

Caso o partícipe da segunda relação desconheça a situação jurídica do seu parceiro, pensamos que, em respeito ao princípio da boa-fé, aplicado ao Direito de Família, a proteção jurídica é medida de inegável justiça.

Exemplifico.

O cidadão, casado na cidade do Salvador, viaja mensalmente a Curitiba, por razão profissional. Lá, encanta-se por uma meiga paranaense, esconde a sua aliança (e a sua condição matrimonial) e conhece a sua família, passando a conviver com a mesma, de forma pública e constante, todas as vezes em que está no Sul.

Como sabemos, a configuração da união estável não exige coabitação, prole ou período mínimo de tempo. Com isso, nada impede que, abusando do estado de inocência de sua companheira, o serelepe baiano culmine por constituir uma realidade paralela subsumível, em nosso sentir, às regras da união estável.

Teríamos, pois, uma situação de união estável putativa, semelhante à que se dá com o casamento 10.

Nesse sentido, Rolf Madaleno:

"Desconhecendo a deslealdade do parceiro casado, instaura-se uma nítida situação de união estável putativa, devendo ser reconhecidos os direitos do companheiro inocente, o qual ignorava o estado civil de seu companheiro, e tampouco a coexistência fática e jurídica do precedente matrimônio, fazendo jus, salvo contrato escrito, à meação dos bens amealhados onerosamente na constância da união estável putativa em nome do parceiro infiel, sem prejuízo de outras reivindicações judiciais, como uma pensão alimentícia, se provar a dependência financeira do companheiro casado, e se porventura o seu parceiro vier a falecer na constância da união estável putativa, poderá se habilitar à herança do de cujus, em relação aos bens comuns, se concorrer com filhos próprios, ou a toda a herança, se concorrer com outros parentes." 11-12

Por outro lado, situação mais delicada ocorre quando, casado ou em união estável, a pessoa mantém relação de concubinato com a sua amante, que sabe e conhece perfeitamente o impedimento existente para a união oficial de ambos.

Nesta hipótese, pois, haveria direitos da(o) amante?

Qualquer tentativa de se apresentar uma resposta única ou apriorística é, em nosso sentir, dada a multifária tessitura dos caminhos da nossa alma, temeridade ou alquimia jurídica.

Uma união paralela fugaz, motivada pela adrenalina ou simplesmente pela química sexual, não poderia, em princípio, conduzir a nenhum tipo de tutela jurídica.

No entanto, por vezes, este paralelismo se alonga no tempo, criando sólidas raízes de convivência, de maneira que desconhecê-lo é negar a própria realidade.

Tão profundo é o seu vínculo, tão linear é a sua constância, que a amante (ou o amante, frise-se) passa, inequivocamente, a colaborar, direta ou indiretamente, na formação do patrimônio do seu parceiro casado, ao longo dos anos de união.

Não é incomum, aliás, que empreendam esforço conjunto para a aquisição de um imóvel, casa ou apartamento, em que possam se encontrar.

Configurada esta hipótese, amigo(a) leitor(a), recorro ao seu bom-senso e à sua inteligência jurídica, indagando-lhe: seria justo negar-se à amante o direito de ser indenizada ou, se for o caso, de haver para si parcela do patrimônio que, comprovadamente, ajudou a construir?

Logicamente que não, em respeito ao próprio princípio que veda o enriquecimento sem causa.

Nesse sentido, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:

"Em decisão da 4ª Turma, do ano de 2003, o Ministro Aldir Passarinho Junior, relator de um recurso (REsp 303.604 – Fonte: DVD Magister, versão 20, ementa 11017727, Editora Magister, Porto Alegre, RS), destacou que é pacífica a orientação das Turmas da 2ª Seção do STJ no sentido de indenizar os serviços domésticos prestados pela concubina ao companheiro durante o período da relação, direito que não é esvaziado pela circunstância de o morto ser casado. No caso em análise, foi identificada a existência de dupla vida em comum, com a mulher legítima e a concubina, por 36 anos. O relacionamento constituiria uma sociedade de fato. O Tribunal de Justiça de São Paulo considerou incabível indenização à concubina. Mas para o ministro relator, é coerente o pagamento de pensão, que foi estabelecida em meio salário mínimo mensal, no período de duração do relacionamento." 13

Também o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

"Namorar homem casado pode render indenização devida pelo período do relacionamento. Durante 12 anos, a concubina dividiu o parceiro com a sua mulher ‘oficial’. Separado da mulher, o parceiro passou a ter com a ex-concubina uma relação estável. Na separação, cinco anos depois, ela entrou com pedido de indenização. Foi atendida por ter provado que no período do concubinato ajudou o homem a ampliar seu patrimônio. A 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul fixou indenização de R$ 10 mil. Para o desembargador José Carlos Teixeira Giorgis, relator da matéria, deve haver a possibilidade do concubino ganhar indenização pela vida em comum. ‘Não se trata de monetarizar a relação afetiva, mas cumprir o dever de solidariedade, evitando o enriquecimento indevido de um sobre o outro, à custa da entrega de um dos parceiros’, justificou. O casal viveu junto de 1975 a 1987, enquanto o parceiro foi casado com outra pessoa. Depois, mantiveram união estável de 1987 a 1992. Com o fim da união, ela ajuizou ação pedindo indenização pelo período em que ele manteve outro casamento. A mulher alegou que trabalhou durante os doze anos para auxiliar o parceiro no aumento de seu patrimônio e, por isso, reivindicou a indenização por serviços prestados. O desembargador José Carlos Teixeira Giorgis entendeu que a mulher deveria ser indenizada por ter investido dinheiro na relação. Participaram do julgamento os desembargadores Luis Felipe Brasil Santos e Maria Berenice Dias." 14

Firmada, pois, a tutela do Direito Obrigacional, indago se seria possível irmos mais além, para se admitir a proteção do próprio Direito de Família.

Não nego esta possibilidade, em situações excepcionais, devidamente justificadas.

Acentuo esta nota de "especialidade", pois, não sendo assim, criaríamos uma ambiência propícia à autuação de golpistas e aproveitadores, simuladores de relações de afeto.

É acentuadamente simplista, e até socialmente desaconselhável, afirmar-se que em toda e qualquer situação a(o) amante concorrerá com a(o) esposa(o) ou com a(o) companheira(o).

Não.

Para que possamos admitir a incidência das regras familiaristas em favor da(o) amante, deve estar suficientemente comprovada, ao longo do tempo, uma relação socioafetiva constante, duradoura, traduzindo, inegavelmente, uma paralela constituição de um núcleo familiar.

Tempo, afeto e aparência de união estável – com óbvia mitigação do aspecto da publicidade – são características que, em nosso sentir, embora não absolutas de per si, devem conduzir o intérprete a aceitar, excepcionalmente, a aplicação das regras do Direito de Família, a exemplo da pensão alimentícia ou do regime de bens (restrito, claro, ao patrimônio amealhado pelos concubinos).

Vejamos caso levado à apreciação do Superior Tribunal de Justiça:

"A Sexta Turma do STJ está apreciando um recurso especial (REsp 674.176) que decidirá sobre a possibilidade de divisão de pensão entre a viúva e a concubina do falecido. A relação extraconjugal teria durado mais de 30 anos e gerado dois filhos. O homem teria, inclusive, providenciado ida da concubina de São Paulo para Recife quando precisou mudar-se a trabalho, com a família." 15

Observe: 30 anos de convivência, filhos, relação duradoura e permanente, mudança de cidade juntamente com os integrantes do núcleo paralelo.

Família, para a doutrina civil-constitucional, traduz não um produto da técnica legislativa, mas uma comunidade de existência moldada pelo afeto:

"A partir do momento em que a família deixou de ser o núcleo econômico e de reprodução para ser o espaço do afeto e do amor, surgiram novas e várias representações sociais para ela." 16

Também Caio Mário, em uma de suas últimas e imortais obras:

"Numa definição sociológica, pode-se dizer com Zannoni que a família compreende uma determinada categoria de ‘relações sociais reconhecidas e portanto institucionais’. Dentro deste conceito, a família ‘não deve necessariamente coincidir com uma definição estritamente jurídica’."

E arremata:

"Quem pretende focalizar os aspectos ético-sociais da família, não pode perder de vista que a multiplicidade e variedade de fatores não consentem fixar um modelo social uniforme." 17

Como, então, leitor(a) amigo(a), você, juiz do caso concreto, negaria o reconhecimento deste vínculo familiar?

Seria negar a própria realidade da vida.

Fechar os olhos para as sutilezas do destino de cada um.

Aliás, sinceramente, você acha realmente possível enganarmos, durante dez, vinte ou trinta anos, a nossa esposa 18?

Até que ponto poderíamos admitir uma quebra inesperada do dever de fidelidade, calcada em um completo estado de desconhecimento da situação do nosso parceiro?

Tenho as minhas dúvidas se este "crime perfeito" é possível de ser realizado, de maneira que se torna imperioso concluir pela aplicação das regras de família, quando devidamente justificadas pelas circunstâncias do caso concreto.

E conforme nos lembra Berenice Dias:

"Situações de fato existem que justificam considerar que alguém possua duas famílias constituídas. São relações de afeto, apesar de consideradas adulterinas, e podem gerar conseqüências jurídicas." 19

Aliás, "a idéia de que o amor é assunto exclusivo dos amantes", afirma Guilherme de Oliveira, catedrático da Faculdade de Direito de Coimbra, "e de que cada casal é o seu próprio legislador supõe que os sistemas jurídicos eliminem progressivamente da pauta patrimonial os conteúdos que outrora serviam a todos indiscutivelmente, mas, hoje, estão ao que parece, sujeitos a negociação, no âmbito da tal ‘relação pura’ e do compromisso permanente" 20.

6 A(o) Amante e o Supremo Tribunal Federal

Recentemente, sem pôr fim definitivamente à controvérsia no âmbito do Direito de Família, a 1ª Turma do STF, no julgamento do RE 397.762-8 (NE: Ementa 26/36, publicada nesta revista, p. 144), negou à concubina de homem casado (com quem manteve relação afetiva por 37 anos) o direito de dividir pensão previdenciária com a viúva 21:

"O Ministro Marco Aurélio (relator) afirmou em seu voto que o § 3º do art. 226 da Constituição diz que a família é reconhecida como a união estável entre homem e mulher, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. Segundo o ministro, o art. 1.727 do Código Civil prevê que o concubinato é o tipo de relação entre homem e mulher impedidos de casar. Neste caso, entendeu o ministro, a união não pode ser considerada estável. É o caso também da relação de Santos e Paixão. Os Ministros Menezes Direito, Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski acompanharam o relator. Lewandowski lembrou que a palavra concubinato – do latim, concubere – significa compartilhar o leito. Já união estável é ‘compartilhar a vida’, salientou o ministro. Para a Constituição, a união estável é o ‘embrião’ de um casamento, salientou Lewandowski, fazendo referência ao julgamento da semana passada, sobre pesquisas com células-tronco embrionárias."

Mas, demonstrando a magnitude do tema, a divergência acentuou-se no voto do Ministro Carlos Britto:

"Já para o Ministro Carlos Britto, ao proteger a família, a maternidade, a infância, a Constituição não faz distinção quanto a casais formais e os impedidos de casar. Para o ministro, ‘à luz do Direito Constitucional brasileiro o que importa é a formação em si de um novo e duradouro núcleo doméstico. A concreta disposição do casal para construir um lar com um subjetivo ânimo de permanência que o tempo objetivamente confirma. Isto é família, pouco importando se um dos parceiros mantém uma concomitante relação sentimental a dois’. O ministro votou contra o recurso do estado da Bahia, por entender que as duas mulheres tiveram a mesma perda e estariam sofrendo as mesmas conseqüências sentimentais e financeiras."

Nota-se, pois, a influência da doutrina familiarista no voto deste último julgador, salientando a complexidade da matéria e a inequívoca ausência de consenso.

7 Conclusões e Conselho

Pois é.

Não é simples este delicado tema.

Longe de ser pacífica, a questão ainda passa por um processo de amadurecimento doutrinário e jurisprudencial, reclamando, no futuro, pronunciamento final do Plenário do Pretório Excelso.

Até lá, é papel de todos os cultores do Direito Civil enfrentar o tema de forma madura, sensata, não-discriminatória, e, acima de tudo, em harmonia com o princípio matricial da dignidade humana aplicado nas relações de afeto.

Lembrando-se sempre de como é arriscado estabelecer uma regra geral para a vida afetiva, tão cheia de exceções.

Em conclusão, e se me permitem um conselho, sugiro que cultivemos sempre a fidelidade a dois em nossas vidas, pois, certamente, assim, teremos mais paz e tranqüilidade.

E que Deus nos ouça!

E o nosso coração também...

1 Vale lembrar que o Código Civil deixou clara a distinção entre "concubinato", relação não-eventual entre pessoas impedidas de casar (amantes), e "companheiros", integrantes da união estável: "Art. 1.727. As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato".

3 Disponível em: http://sistemas.aids.gov.br/imprensa/Noticias.asp?NOTCod=62009. Acesso em: 13 jul. 2008.

4 E o exemplo poderia ser dado perfeitamente com uma mulher. Vivemos a era da igualdade, não havendo mais espaço para imposição da predominância masculina. Aliás, não existe mais ambiência para determinadas correntes de pensamento da nossa doutrina, como a esposada pelo grande Washington de Barros Monteiro, estrela na nossa constelação de civilistas, quando afirma: "Entretanto, do ponto de vista puramente psicológico, torna-se sem dúvida mais grave o adultério da mulher. Quase sempre, a infidelidade no homem é fruto de capricho passageiro ou de um desejo momentâneo. Seu deslize não afeta de modo algum o amor pela mulher. O adultério desta, ao revés, vem demonstrar que se acham definitivamente rotos os laços afetivos que a prendiam ao marido e irremediavelmente comprometida a estabilidade do lar. Para o homem, escreve Somerset Maugham, uma ligação passageira não tem significação sentimental, ao passo que para a mulher tem" (In: Curso de Direito Civil, 2. vol., Direito de Família, 35. ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 117). Nos dias de hoje, ainda que a infidelidade masculina seja muito mais freqüente, todos nós, homens e mulheres, estamos sujeitos a desvios e tropeços de conduta na relação a dois, afigurando-se arriscado estabelecer, em nosso sentir, ainda que em nível psicológico, uma escala de gravidade. Ou você concorda com o Prof. Barros Monteiro?...

5 Interessa notar que o art. 1.724, regulador dos deveres dos companheiros, utiliza o conceito mais amplo de "lealdade", o qual, inequivocamente, compreende o compromisso de fidelidade sexual e afetiva durante toda a união.

6 O próprio Superior Tribunal de Justiça já admitiu responsabilidade civil pela traição, por conta do reconhecimento de dano moral: "Um pai que, durante mais de 20 anos, foi enganado sobre a verdadeira paternidade biológica dos dois filhos nascidos durante seu casamento receberá da ex-mulher R$ 200 mil a título de indenização por danos morais, em razão da omissão referida. O caso de omissão de paternidade envolvendo o casal, residente no Rio de Janeiro e separado há mais de 17 anos, chegou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) em recursos especiais interpostos por ambas as partes. O ex-marido requereu, em síntese, a majoração do valor da indenização com a inclusão da prática do adultério, indenização por dano material pelos prejuízos patrimoniais sofridos e pediu também que o ex-amante e atual marido da sua ex-mulher responda solidariamente pelos danos morais. A ex-mulher queria reduzir o valor da indenização arbitrado em primeiro grau e mantido pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Por 3 a 2, a 3ª Turma do STJ, acompanhando o voto da relatora, Ministra Nancy Andrighi, rejeitou todos os pedidos formulados pelas partes e manteve o valor da indenização fixado pela Justiça fluminense. Segundo a relatora, o desconhecimento do fato de não ser o pai biológico dos filhos gerados durante o casamento atinge a dignidade e a honra subjetiva do cônjuge, justificando a reparação pelos danos morais suportados. Em seu voto, a Ministra Nancy Andrighi destacou que a pretendida indenização por dano moral em decorrência da infidelidade conjugal foi afastada pelo Tribunal de origem ao reconhecer a ocorrência do perdão tácito, uma vez que, segundo os autos, o ex-marido na época da separação inclusive se propôs a pagar alimentos à ex-mulher. Para a ministra, a ex-mulher transgrediu o dever da lealdade e da sinceridade ao omitir do cônjuge, deliberadamente, a verdadeira paternidade biológica dos filhos gerados na constância do casamento, mantendo-o na ignorância. Sobre o pedido de reconhecimento da solidariedade, a ministra sustentou que não há como atribuir responsabilidade solidária ao então amante e atual marido, pois não existem nos autos elementos que demonstrem colaboração culposa ou conduta ilícita que a justifique. Para Nancy Andrighi, até seria possível vislumbrar descumprimento de um dever moral de sinceridade e honestidade, considerando ser fato incontroverso nos autos a amizade entre o ex-marido e o então amante. ‘Entretanto, a violação de um dever moral não justificaria o reconhecimento da solidariedade prevista no art. 1.518 do CC/16’, ressaltou a ministra" (Disponível em: http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=84969&tmp.area_anterior=44&tmp.argumento_pesquisa=infidelidade#. Acesso em: 13 jul. 2008). Mais inovadora ainda é a notícia de indenização por infidelidade virtual: "A Justiça do Distrito Federal aceitou a troca de mensagens por e-mail entre um homem e sua amante como prova de adultério e condenou o homem a pagar indenização de R$ 20 mil por danos morais à ex-mulher. O autor da sentença, Juiz Jansen Fialho de Almeida, titular da 2ª Vara Cível de Brasília, desconsiderou a alegação do homem de quebra de sigilo das mensagens eletrônicas, porque os e-mails estavam gravados no computador de uso da família e a mulher tinha acesso à senha do ex-marido. ‘Simples arquivos não estão resguardados pelo sigilo conferido às correspondências’, concluiu. Cabe recurso ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal. Para o juiz, o adultério foi demonstrado pela troca de mensagens eróticas. O dano moral se caracterizou porque, nas mensagens, o marido fazia comentários jocosos sobre o desempenho sexual da mulher, afirmando que ela era ‘fria’ na cama. ‘Se a traição, por si só, já causa abalo psicológico ao cônjuge traído, tenho que a honra subjetiva da autora foi muito mais agredida, em saber que seu marido, além de traí-la, não a respeitava, fazendo comentários difamatórios quanto à sua vida íntima, perante sua amante, decidiu Jansen de Almeida’" (Disponível em: http://www.conjur.com.br/static/text/66569,1#null. Acesso em: 13 jul. 2008).

7 Parte da doutrina vai mais além, erigindo a monogamia como um princípio: "O princípio da monogamia, embora funcione como um ponto-chave das conexões morais, não é uma regra moral, nem moralista. É um princípio jurídico organizador das relações conjugais" (PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Uma principiologia para o Direito de Família. Anais do V Congresso Brasileiro de Direito de Família. Belo Horizonte: IBDFAM, 2006, p. 848-849).

8 O Fim da Monogamia?, reportagem da Revista Galileu, publicação da Editora Globo, outubro de 2007, p. 41. Outras regras do "poliamor" apresentadas na mesma matéria: "A filosofia do poliamor nada mais é do que a aceitação direta e a celebração da realidade da natureza humana; o amor é um recurso infinito. Ninguém duvida de que você possa amar mais de um filho. Isso também se aplica aos amigos; o ciúme não é inato, inevitável e impossível de superar. Mas é possível lidar muito bem com o sentimento. Os poliamoristas criaram um novo termo oposto a ele: compersion (algo como ‘comprazer’ em português). Trata-se do contentamento que sentimos ao sabermos que uma pessoa querida é amada por mais alguém; segundo suas crenças, eles representam os verdadeiros valores familiares. Têm a coragem de viver um estilo de vida alternativo que, embora condenado por parte da sociedade, é satisfatório e recompensador. Crianças com muitos pais e mães têm mais chances de serem bem cuidadas e menos risco de se sentirem abandonadas se alguém deixa a família por alguma razão" (fl. 44).

10 O casamento putativo no Código Civil está previsto no art. 1.561: "Embora anulável ou mesmo nulo, se contraído de boa-fé por ambos os cônjuges, o casamento, em relação a estes como aos filhos, produz todos os efeitos até o dia da sentença anulatória. § 1º Se um dos cônjuges estava de boa-fé ao celebrar o casamento, os seus efeitos civis só a ele e aos filhos aproveitarão. § 2º Se ambos os cônjuges estavam de má-fé ao celebrar o casamento, os seus efeitos civis só aos filhos aproveitarão".

11 MADALENO, Rolf. Curso de Direito de Família. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 819.

12 O Superior Tribunal de Justiça, no entanto, posto se trate de forte teoria na doutrina, enfrentando-a, não a aceitou: "UNIÃO ESTÁVEL. RECONHECIMENTO DE DUAS UNIÕES CONCOMITANTES. EQUIPARAÇÃO AO CASAMENTO PUTATIVO. LEI Nº 9.728/96. 1. Mantendo o autor da herança união estável com uma mulher, o posterior relacionamento com outra, sem que se haja desvinculado da primeira, com quem continuou a viver como se fossem marido e mulher, não há como configurar união estável concomitante, incabível a equiparação ao casamento putativo. 2. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 789.293/RJ, Rel. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, 3ª T., julgado em 16.02.2006, DJ 20.03.2006 p. 271 – Fonte: DVD Magister, versão 20, ementa 11300830, Editora Magister, Porto Alegre, RS)". Cremos, de nossa parte, que este entendimento seja futuramente modificado.

13 Disponível em: http://www.conjur.com.br/static/text/60967,1. Acesso em: 13 jul. 2008.

14 Disponível em: http://www.conjur.com.br/static/text/40960,1. Acesso em: 13 jul. 2008.

16 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de família e o novo Código Civil. PEREIRA, Rodrigo da Cunha; DIAS, Maria Berenice (Coords.). Belo Horizonte: Del Rey/IBDFAM, 2002, p. 226-227.

17 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Direito civil: alguns aspectos da sua evolução. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 170.

18 Ou a nossa companheira, marido ou companheiro?...

19 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p. 179.

20 OLIVEIRA, Guilherme de. Temas de Direito de Família – 1. Coimbra: Coimbra Editora, 2005, p. 338.